Li sua carta imensa, senti a tristeza de uma porta cerrada. Vaga, perdendo-se em exigências, sem visão. Apego ao abstrato, à curva, ao nó. O olhar, sentia-o. O frio chumbava as atitudes mais excêntricas e corajosas. O frio acovarda. Refletir. A facilidade cansa, banaliza qualquer manifesto interior. Sinto a falta de doçura do gesto, compaixão no rosto liso e iluminado, suor, reflexo. Uma pausa no caminho, fome, sede e coceiras nos pés. Deixa ali o papel, largado, como uma arma que acabara de ser disparada. Conhecemos pessoas interessantes pelo caminho. É cansativo ser tratada como não-pensante, daquela maneira condescendente, sem alegria, com discurso impositivo. É cansativo ter que explicar porque sente isso, dizer que isso é legítimo, explicar obviedades. Entristece, porque a batalha nunca acaba, e sempre é perdida. A beleza é o agir, o quanto se consegue provocar transformações.

Sai dali sem rumo e senta em um boteco. Queria contos eróticos, música que aperte as coxas. Uma relativa afirmação como um trampolim para uma reflexão mais ampla. Pede aquela cachacinha estabelece a atmosfera ali na mesa da esquina. Quando se senta no canto tem proteção, vemos quem se aproxima e afirmamos que sim, queremos beber sozinhas. Mas a verdade é que é um saco. (Você não tem humor! Se está sozinha qual o problema de se interromper? Tem mulheres que fazem isso pra chamar a atenção, sabia? Graças a você que reclama a vida fica mais sem graça, pesada. Vê problema em tudo, que chatice. Sempre foi assim, porque o espanto. Mas eu? Nunca! Se eu faço você é capaz de entender-me, claro. Se não, eu te explico, vem cá, te explico como agir. Eu. O que sente, não… Eu explico como você deve agir e como você deve responder a isso. Paciência, alegria, disposição. Sempre. Se não você é chata. Dá pra todos e não pra mim).

O outro ri. Já deveria ter se acostumado a dizerem como agir. Não. Irá sempre se afastar disso, não suporta mais ouvir, existirão outros bares, outras esquinas, outras solidões. Sobre nossas atitudes confusas em relação a beleza e o contato com o outro… Para transcender a definição social comum de beleza como ‘uma alegria dos sentidos’ busca a noção das filosofias para multiplicar a noção, para permitir tipos de beleza, belezas, com adjetivos.

Do outro lado, o relento.

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Jean Dieuzaide

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