Direto pro chuveiro, água, água.

Pelo direito de viver a própria dor sabendo que um dia irá passar. Plenamente justificada, plenamente. Hoje isso de entender já não é o bastante. Entendimento não basta, não lhe trouxe autonomia e nem o sentir-se à vontade.

O estômago sente, passou o dia sem comer. Pensa nos detalhes e gosta. Conseguiu ultrapassar os escombros, conseguiu levar uma bolsa pequena. Quase chegou. Nunca chegara tão perto. Um calafrio percorre o corpo, uma mistura de emoção da expectativa (sente que em breve conseguirá ultrapassar os limites) e de pavor (porque sente que em breve irá ultrapassar os limites). Diversas vezes o ser da experiência alcança um sentido humano. Mas o que busca é sobre humano. Busca a flexibilidade do erro, do choro, da raiva, da renúncia. Ai, que pieguice insuportável. Come rapidamente, serve-se de vinho, e desmancha na frente da TV.

Olha em volta e faz anotações mentais (mandar arrumar a cadeira que está bamba, desinfetar a pia, guardar os talheres, separar os calçados). Nada tem a urgência maior que o descanso do enfrentamento perdido. Me deixei tombar no vazio, perdida de mim e do mundo.

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