Teve uma vez quando criança, era aula de educação física e trocávamos de roupa ali mesmo na sala, escola pública que era. Era pra eu ter colocado o short embaixo da calça e assim pensando a tirei, na frente de todos os colegas. E estava de calcinha amarela e um menino riu. Não consigo esquecer isso, primeira vez que morria. De lá pra cá, morri várias vezes mais. As peculiaridades do caráter de pessoas aparentemente invisíveis deveriam ser compreendidas como importantes. Pois procuramos a desconstrução. A gente lembra, a gente cultiva saudade. Os copos que apareciam na foto davam a impressão que era uma pessoa organizada. Relativamente, mas dá a sensação de que ali haveria algo mais. Quem sabe outra pequena morte daquelas de darem vergonha nas bochechas e não nos deixarem esquecer. São arranjos que, de uma forma ou de outra, bloqueavam a importância da vida cotidiana. Conte-me dez coisas em que eu possa acreditar. A lua eclipsou o sol dia desses. Os muros são blocos de anotações das ruas. Segurei meus pés e meu coração que já vinha a disparar, protegendo-me da interferência do mundo. Maria ama peras e gosta um pouco de maçãs. Os filósofos são pensadores do abstrato. As alegrias já existiam mas tem extrema dificuldade em enxergar e avaliar as opções. Os desafios tendem a ser minimizados ao longo do tempo, principalmente no amor e no humor. Neles, tudo que se faz terá consequências decisivas. Neles, o tempo comanda nossas decisões equilibrando e integrando-se. As luas que estavam em seus ombros – impossível não sorrir – mostravam a sua verdadeira vontade (o que era a minha derrota). Pena que passou tanto tempo, tantos dias. Era muito bonito quando a gente se lembrava. Dava pra sorrir demais e era pra ser assim.

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