Tristes trópicos

E lá foi-se, disposta a encontrar uma forma de se expressar com a maior clareza possível. Seja descritiva. Desceu as escadas com aquela leve palpitação. Bom vê-lo caminhando na sua direção, momento de um olhar o outro por inteiro. Abraço apertado, suspiro dobrado, fique à vontade, vamos subir (suspiro). Bom estar aqui novamente. Mochila de um lado, olhar do outro, pé no chão, copo de água. Muita coisa pra contar, estar perto. Alma responsável por facilitar tudo para todos. O mundo complica, você tenta o simplificar. Observa melhor a arquitetura dos pensamentos como se isso fosse lhes garantir mais força individual.

Pode até ser assim (os óleos essenciais de cipreste, cedro e canela podem ajudar a trabalhar o desapego).

Pelo menos aqui nestes tristes trópicos que emulam a antiga Roma, que com pão e circo resolviam todas as inquietações e desejos, e mantinham o povo sob alegre cabestro; entre todas as severidades e restrições, bastante circo, nesse horripilante carnaval. Circo, postes e muito povo du bem.

Assim mesmo quer fazer tua alma, entre todas as severidades e amarguras existenciais, de vez em quando enfiar o pé na porta e declarar: vem. Sufoca e volta.

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Alívio intenso

Seja de um jeito claro e direto, ou obscuro e retorcido o (temporariamente) temperamento frágil desperta tanto amor que se descobre incapaz de se interessar por outras pessoas. Faz sorrir e enternecer e ainda jura entender os sentimentos de afeição pelos meios que fazem com que se pareçam com um ser humano.

Um é a projeção do outro, da voz, do ouvir. Então, é risco o tempo todo…  enquanto digitava no celular as primeiras impressões de um amor desfeito, todos estavam em silêncio a olhar. O som que vinha das roupas aquecia, e fazia desejar. Quando se encontra algo que faz efeito, a gente acaba que coloca isso no coração, na alma. Quando dá certo é um alívio muito intenso.

Com os bolsos vazios de sentidos, os dias (vazios) minimizam a incapacidade de se relacionar com gente viva. Estejam ou não por trás dos aparelhos. Para saber o que pensam do mundo e o que sentem de verdade: carência, frustração, insegurança, desnorteamento, medo e hipersensibilidade (às reações danosas, desconfortáveis e às vezes fatais produzidas pelo sistema imune normal) em relação aos próprios dilemas num resumo de uma realidade melancólica.

Que os aparelhos salvem-nos da solidão.

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Laura Henno, Rainy silence, 2007

 

 

 

Quais são as palavras que você ainda não tem?

O único voto ainda desconhecido era o seu. Estavam fazendo de tudo com menos tempo. Se houvesse o mínimo de cuidado com os detalhes, não saberia que estava prestes a ser esquecida. Uma linguagem cujos códigos já estão definidos, não tendo tido ali nenhum papel significativo em sua construção. Era uma linguagem já estabelecida e que não poderia ser quebrada ou questionada, principalmente por quem. Uma postura cada vez mais ativa e irredutível frente a qualquer desafio e sentirá força para alcançá-la (a ação) pelas palavras. Interrompida a visibilidade sem a qual não poderíamos viver verdadeiramente,  cada um de nós desenha o rosto de seu próprio medo, essencialmente cientes de que não deveriam acreditar tão facilmente no que era dito.  A promessa de imortalidade, em um sentido, é favorável a toda e qualquer forma para compartilhar e espalhar tão bela empreitada. Porque você abraçou, confortou e disse como era e que iria tentar triturar seus ossos até virar poeira?  O procedimento que aparentava ter era simples, direto e claro por conta de suas reais e naturais necessidades.  Beleza efêmera! Toda vez que olha, chama, pensa… missão pessoal também. Soltar a voz  tem riscos: vai mudar ou acabar com algo. Silêncios não lhe protegeram. A seu favor e a seu lado calados, como garrafas, transformando silêncios em linguagens, viajavam. Só pra provocar aprendemos a trabalhar e falar. E quando estamos cansados ficamos estritamente condenados à mudez, e até mesmo à desaparição. De outra pessoa esperamos mudanças. 

Até o fechamento desta matéria o caso não havia sido resolvido e a acusada continuava algemada a uma cadeira.

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Não fazer absolutamente nada

Eu não vou mudar de assunto, mas a compreensão de tudo que está envolvido nos faz perder o fôlego, e possivelmente, suar frio.

O tanto do que está à nossa volta não acontecerá de forma automática, impera a vontade de tomar a iniciativa de enxergar além de alguns conceitos e (auto)convencimentos. As coisas têm uma dimensão muito maior do que parecem. (Em poucos segundos eu serei capaz de ler seus pensamentos!).

Presente nas situações de afeto, a dor facilita se colocar no dualismo do mundo perfeito. Dentro da cabeça as contrações, a falta de fome e sono, euforia, taquicardia, suores e umidades, centros do prazer estimulados, vontade ardente de conexão,  forte atração, admiração, e a vontade de liberar sentimentos ruins seriam formas de não permitir que eles se acumulassem dentro de nós. Só que esse não-acúmulo acontecerá de qualquer jeito.

Não fazer absolutamente nada é melhor do que tentar algum processo catártico, usando o bom e velho respira, respira. Encontrar o meio termo assertivo entre a passividade e a agressividade. A sabedoria roseana, que propunha caminho do meio, o terceiro, a terceira margem, não estava tão longe da verdade afinal. Você e o outro, você e o mundo, esquerda-direita, em cima-embaixo, bom-mau, grande-pequeno, rápido-lento… na realidade, o que está além das palavras ou das ideias é que interessam.

Subterrâneo. 

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E sempre ama pra sempre

E como se a onda de mudanças não os atingisse imunes aos tsunamis existenciais. Li assim: recebi uma resposta “sabonete”. Pergunta “sabonete”, vida sabonete”, alegria “sabonete”, escoriações “sabonete”. Deveria tomar uma espécie de “catalisador” vibrante e radiante que só o escorrego proporciona. É muito difícil reagir e esse frio que não passa. Eu não gosto mais de mim, entende? Assim, ‘sem ansiedade e com a mente aberta ao que der e vier, faze tudo com calma, como se tivesses todo o tempo do mundo, como se não experimentasses nenhuma limitação, age como quem verdadeiramente és, um ser infinito, com toda a eternidade disponível’. Talvez a ponta de rancor em seu peito seja mais profunda que imaginaria, porque ouviu que falaram (mal) de ti e sentiu aquilo de novo. Da próxima vez, pede para te incluírem na roda em que… não saberia dizer. Você sabe coisas terríveis a teu respeito! E age como se estivesse em redoma de vidro em uma tentativa de um diálogo com a realidade sem um certo norteador de formação pessoal. O que mostra como a ira dirigida ao outro é, muitas vezes, uma confusão entre o que é do outro e o que é da gente mesmo… Rasos, superficiais, sentidos fluidos. Prepotência. Consulta, guardado debaixo do travesseiro, o manual de como começar (bem).

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Vácuo

Não a diferença, mas a igualdade e apesar dos conselhos de como se deve pensar bem, suscitou uma ótima oportunidade para se refazer do golpe. Tinham muitas, muitas pessoas perto. Quem precisar de ajuda por esse mundo de expressão puramente sexual poderia obter o suficiente dele. A gente se vê transformando até mesmo as demonstrações de puro afeto em atos com toques de brutalidade. Beijos e abraços aumentam significativamente as chances de entorpecer meus sentimentos afetando o desprendimento de seu corpo físico e a necessidade de sensualidade e intimidade aumenta progressivamente. Intimidade. Com o vácuo, vem a indisponibilidade de alma, dormência, falta de foco e paciência emocional. O corpo pede a nossa sensualidade e intimidade.

Esboça um sorriso. Só esboça, a inundação se perdeu. 

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Um cigarro entre os dedos

A luz vinha do corredor enquanto ela descansava a cabeça no seu peito.

Eles entenderam cada peça mas não conseguiam vê-las como um todo. Acordou de sono intranquilo e a queda teria ocorrido de qualquer maneira. Falou da lua e da noite e das botas cheias de lama. Não conseguira entender o que eles deveriam fazer ou às vezes até onde eles estavam, ou deveriam estar. Foi-se o tempo que ser beijada por um anjo era um casual encontro de dois mundos, sem trono, sem realezas. Confissões inconfessas, intensamente o que é mais importante não é dito, nunca é dito.

Queria fazer uma música. A diferença é que talvez você não perceba o magnetismo que há entre eles e o controle dos corpos, corpo controlado. Ao sabor da decepção com a reação ‘ela gosta de’ e em seguida ‘você não vai ser a mesma’. Experiência única. Não me peçam para ser mais precisa! Essa proeza só fazia crescer o (des)limite. Deixou crescer a barba em pensamento, comprou um par de óculos para míope e passava as noites espiando o céu estrelado com um cigarro entre os dedos.

Traduzindo em miúdos: a fumaça em loop.

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Ibrahim Mahama

 

O corpo boceja

Deixou as memórias no corpo – apoderou-se astuciosa da sua (c)alma. Aquela noite me tornou, retornou-me. Eu recobrava a vida, para logo perdê-la, desenrolava-se em outra que a atingiu, a adoeceu. Alimentando, assim como eles, de tradições e poderes apodrecidos.  O desperdício de seus tecidos era o que aflorava ao longo do sono, tornando tudo absurdo diante da biologia que rege. Permite e reforça a exigência das curvas sempre exatas e os afagos na cabeça tinham deixado seus sentidos mais agudos e precisos. E conversas baixas depois de ter o corpo perfurado em diversos pontos para a retirada do tumor. Comum, não limpo.

 

Não será um traje que irá impedir, de tão complexo que se desenha o panorama. Enquanto teu corpo boceja, vamos colorir?

 

 

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Os efeitos no rosto

A vida passou para todos e fugir dos quatro avisos não houve qualquer problema, não fossem as ocupações excessivas, obviamente. Maravilhoso. O ajudante na deterioração dos sentidos – na pele – recusou-se a nos receber ou abrigar-nos como a sabedoria da vida proporcionaria a uma boa alma.  Um excelente querer está sendo dispensado e ninguém pode escapar da doença e desses efeitos. Lembrando que essa deterioração física é vivida como um rito de passagem ou até mesmo uma obrigação.

Terá de ser reinventada pela esmagadora maioria dos que não se conformam que esse mundo é um tanto quanto limitado.

O ato de não poder angustiava. O que acontece é que cicatrizar escondido hoje é o que restou da ação e foi o que lhe deu a emoção. A forma como ele se apertou com uma corda de violino até gotas começaram a partir dele, gela. E a forma mais eficiente ou do jeito que ela quebrou e jogou água a esconder seu pânico, até encontrar um lugar para ficar sozinha e desmoronar quando ele pulou. Doeu fundo tudo pra saber qual a animosidade era contra naquele momento. Uma vez que você começar a soletrar palavras, algumas respostas vêm.

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Os absurdos foram terreno fértil

Propôs no começo da década e era,  aliás é, como você vive no mundo onde eles acreditam ou fazem algo que outros não conseguem fazer. As alegrias e sacrifícios mal disfarçavam o desejo de se diferenciar. Era que seriam melhores que da outra vez, isso simA questão dos abusos não-verbais radiantes e inspiradores estão na verdade extrapolando o denso e raro em seu meio. Sim, deu positivo. A letra do bilhete insinuando que rejeitara todas as preliminares, não raras vezes, de forma errônea. Dizia que poucas têm coragem de tocar e de traçar um caminho mais longo.  (Rejeitou todas as preliminares).

Então como eu posso ter as três estrelas que riscam o céu? A noite, afoga-me. Ele chutou minha bunda, e como então dirigir sem que ele não se sinta ainda pior?  Antes de pensar nos seus efeitos que se mantém pela vida toda,  eu fui pra casa. Foi quando  me diverti transitando o tempo todo entre essa pessoa que foi  notícia tardia para alguns, e aquela menos fragmentada. Mas muito além de mobília exótica, passaram a ter acesso a populares acessórios. Não foi a única de quem me desviei na rua. Tem donos, apanhado de emanações, como diz a poesia de um menino. Eles aparecem à noite e você tem que aprender a viver naquele mundo. E não é isso, é o gênero. 

Depois, ainda comprou uma maça vermelha e saiu com ela nos dentes.

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Um toque de leve

Agora é deixar de molho, posso entrar pra tomar café. Uma possível overdose neste local, pensava enquanto a água fervendo no fogão chamou atenção. Quase famoso esse café, quase um prazer e quase que se permite uns minutos de letargia. Tinha uma grave e crônica exaustão mental, e silenciar-se era o que mais almejava. Falava uma certa ingenuidade desse estado frágil, mas não perdera fé de que se recuperaria. Me lembro que encostei nele, falei umas sacanagens… ríamos muito, de um jeito que surpreende. É como fazer tudo como a primeira vez. Sem água, sem comida, sem cordas de segurança. Flores artificiais no cabelo ganham status, é permitido abusar. Acho que o futuro talvez se arrependa dessa desconstrução.

Ele alisou a minha mão com o dedo e disse que estava feliz de eu estar ali.

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Reagir a cada frame

Até que nosso coração insista em ter nossa mente conduzida, o que por muitas vezes não nos impede de cair no que distingue a textura de cada imagem de um sonho proposto,  nos arriscamos. Nosso cálido branco recém limpo da parede contrastava com o azul de fora da esquadria numa impressionante força para o alívio e calma.

O pulmão com uma boa carga de fumaças devidamente apreciadas reage aliviado quando você pega um conflito e tenta extrair dele visões românticas a partir de músicas, com uma persistência de buda,  até que nossas glândulas lacrimais estejam reagindo a cada frame.

Age por trás do olho, perfumando, prestando atenção na continuidade de cada pedacinho de tempo como se carregasse no corpo os olhares que eles proporcionam. A trilha sonora inventamos o tempo todo sem saber. Sempre existe, com ou sem música de fundo. Parece que o banho é aquilo mesmo que lhe limpa, refresca e cheira. E, do jeito que surge, um processo de construção cinematográfica da vida recebe cuidado e carinho. Eu deixo a comoção em torno de mim nestes dias diminuírem um pouco antes que eu derreta. Como uma menina boba caminho levinho por aí.

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Há de se praticar pequenos nadas todos os dias.

A passagem aberta do formal ao afetivo é mais para circular com um pouco de irresponsabilidade e de maneira muda, alheia à linguagem, por centros de força. Por um momento de entorpecimento uma coisa que ficou no meio do caminho serviu-se ao ímpeto de aliviar a minha fome. Os estilhaços de significado juntam-se a estilhaços de imagem com uma forte intensidade de desejos pessoais entre corpo e forma, que quando perdem contato com a estrutura interna, tornam-se moles, porosas, arenosas. Tornam a ambiguidade ainda mais endurecida. Um casco que, pela própria imobilidade, vai se recobrindo de evidente lirismo. Mesmo as intervenções que continuam fecundando nosso pensamento tornam as impurezas mais discretas. E é assim que as coisas funcionam ao lidar com formas pouco definidas de matéria mole, evitando quase sempre os vazios conflitos por miudezas e  a escolha construtiva era um fato ético, individual de atribuição de sentido. (Sempre subjetiva).

Disposto a qualquer significado o fogo começou às 4h45 da manhã.

 

 

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Inoxidável

Exatamente assim que o descompasso entre mim e as coisas, de seus próprios quereres, improvisa o sentido. Eu queria que fosse, ouviu? Onde a tortura nunca para e às vezes até muda de nome. Reencontro inesperado de dois velhos conhecidos num sentido geral tende a ser um excelente momento para embelezar-se diante do outro. Porque queria que assim fosse intimidade: mais úmida. Como  obter respostas do nada? Adaptados estavam a si mesmos. Criando imagens de tolos, essa não sou eu. Pensa que precisa desativar essa vigilância e ele está falando de suas expectativas. Permitindo-se atos de diversão e espalhava o ar de sua graça naquelas coisas que havia imaginado.

A umidade do pranto cria uma membrana que separa as coisas elevadas, com um certo regalo. Lhe contando coisas se agitava e requisitando opiniões envolve as palavras como um agasalho em forma de rolo – pra embrulhar as mãos para protegê-las do frio. Uma espécie de rede. E pelo tamanho de seu desprendimento e de sua capacidade de engolir o pranto, até de uma forma original, o momento é particularmente propício para o amor.