Ressoa

Estamos caminhando pela cidade, nós andamos como fantasmas negras. Como se repara uma parte da louça quebrada? Você não conseguia me ouvir, estava muito ocupado gritando com o sol. O sol está muito brilhante para se viver, dizia.

Acho que percebi que estou mais em paz do que penso que estou, ou do que tenho estado nos últimos anos. Há mais de uma qualidade zen sobre as coisas em mim, de certa forma. Você basicamente foi uma espécie de ser interessante em espaços contidos. O que se descobriu sobre si mesmo, apenas sendo lá, foi frágil, poderoso e suspenso nas lacunas. Eu quero pegar sua pele e então você poderá me sentir correndo por suas veias quando estiver caminhando.

Eu me segurei nas minhas coisas, tão amarrado. Eu quis tocar você, deixe-me continuar como se fossem bolhas de espuma ao sol, deixe-me permanecer nas mãos, corpo e pulso, lenços encardidos. Ponha as mãos nos meus bolsos de trás, retire os pequenos objetos mesmo sem o meu consentimento e coloque-os sobre a mesa – bolas e insetos que se arrastam. Seja gentil. Ainda tenho conseguido correr ao redor do quarteirão, vez ou outra, ver as pessoas novas e novas, novas e velhas, alguma canja de galinha, galanteios que fazem cócegas na cor azul e um xale velho xadrez.

E de cá, muita resposta vaga, pois eu não sei e não sei e me agarro a isso pois é preciso. Mas o sorriso me acontece.

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Porque tem dia que tem

Muitas pessoas pensam ou acreditam ou sabem que sentem – mas isso é pensar ou acreditar ou saber; não sentir. E talvez por se estar sentindo – não sabendo, nem acreditando ou pensando – apenas esteja triste. Um jogo paciente que não consigo achar meu jeito de jogar. É apenas uma questão de saber quando dizer não ou sim.

Deixe seus planetas colidirem, disponha-se a esta conversa. Se eu digo brilho é porque nada é tão fácil quanto usar palavras como se outra pessoa fosse. Todos nós fazemos exatamente isso quase o tempo todo – e sempre que o fazemos, não somos poetas. Este é um escurecimento da minha mente, se agora poderíamos estar estocando os últimos dez centavos ou planejando alguns crimes, poderíamos.

Eu conheço um lugar onde eu posso voar, criar peixinhos e talvez desenhar um plano, colecionar algumas xícaras sem par, cervejas.

Se você quer apreender o som não precisa de uma reserva, você deveria estar dormindo noite e dia naquela hora. Eu estou bem acordada, sentindo-me derrotada e é para para queimar algumas das sensações de ser solúvel, afinal de contas. E enquanto eu fiquei parada, senti um arrepio, pensei que talvez você também. Quisesse sentir isso como um caminho para um sempre incluído.

E é por isso que se você estiver olhando para mim, vou tentar aguentar o tranco.

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Sempre se faz sentir

Se eu perder você na rua, se eu perder você na rua à noite, venha aqui, volte. Sinta-se por fazer, quebre a cabeça, feche a porta de aço preto, quebre meu pente. Se levante, nas colinas altas eu não negocio, eu posso, posso andar com você?

Quanto tempo leva para deslizar de volta no tempo, quanto do tempo que muda e não muda, gravado no loop automático é necessário para…, talvez sejamos de ferro. Não faça barulho, tenha o tempo necessário para deslizar-se de volta, diga o que se diz costumeiramente. Para desfazer-se para trás, espere. As perguntas dizem que eu gosto de você, principalmente tarde da noite, talvez mais na pequena manhã. Mantenha-me apertada, segure firme, segure-me apertado como uma urdidura colorida.

Pois eu talvez goste de você principalmente no meio da tarde, quebre minha mente, faça chover no meu quarto, seja doce e sonolento. Eu voltarei a rebobinar, se eu voltar novamente, eu esqueci, não me lembro mais, ritmo e conhecimento, se eu retroceder, todas as cores de você desbotarão.

Olhando nos seus olhos, olhando nos seus olhos, eu posso me lembrar, nós podemos três vezes mais. Mantenha-nos juntos, mantenha-nos juntos. No tempo que corre para trás você pode ser eu, nadar os dias como televisão e videos cassete. O rosto pedra, palavra pedra, é tudo que eu deveria esperar de você? Esfregue-se rapidamente da poeira, é o novo passado que o mantém como se o novo passado te abraçasse.
Apenas lembre-se de contato, boom, contato, é o caminho, seu primeiro, seu último no tempo entre em contato, agite-o, não vá vagar em mim, não fique vago em mim.

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O lado mais bonito

Imediatamente em vários lados vê claramente na imagem refletida,  cujos traços faciais flutuam entre o susto repentino e o vazio ausente, uma vontade de vermelho. Uma cor que mais respira para você do que a vida. Ela parece envergonhada de sentir a energia que penetra no seu corpo flácido, entregue. Está prestes a avançar de muitas e variadas formas.

Qualquer um que não conheça apenas os frequentadores ocasionais daqueles becos, não se surpreende ao ver os desenhos orgânicos coloridos pregados nos postes. Os conflitos domésticos sempre formam o contexto. Quem regularmente transitava por aquele bairro, fazia as vestes de figuras longilíneas, dessas que se imagina que buscam sempre o que produz prazer e evitam o que é aversivo. Aos desavisados tudo seria desleixo ou formas personificadas de algum tipo de câncer social. Na maioria das biografias, a ausência apareceu apenas esquemática. Razão suficiente para que o romancista noturno encontre a estadia solitária no coração de uma multidão. Como foi chamada, 45 anos depois, a esquina Rei das Copas Brilhantes, de alguma forma consegue sempre tirar as coisas do lugar, num outro espaço tempo. Porque de vez em quando, ali era um lugar onde se perde a cabeça. Uma espécie de abandono, uma espécie de ausência. 

Todos os dias cruza com um homem vestido de armadura, que segura um copo, como se oferecesse a alguém na frente dele. Avante! Parece que encontrou o equilíbrio perfeito entre perseguir o seu imaginário e fazer o que é certo. Segue empobrecida para o temporariamente seu quarto gasto, sabe que algo em seu corpo deva ser removido, seja um dente ou outra parte, e será substituído por uma peça artificial. Incompletude, insuficiência, talvez remoção necessária para uma nova identidade.

Sem as barras delimitantes e as figuras que se confundem com a arquitetura, o visitante noturno e o famoso Cavaleiro Duvidoso se perderiam. Graças a quem segura os bulevares onde passam carros esportivos, lá se encontra momentos curtos de esquecer o trabalho para ser um artista de um século.

Desejo, fogo, pensamento, alegria – recita, apertando os dedos das mãos nos pequenos nós até doerem as articulações. Oração diária.

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A frieza do cotidiano

Às vezes, se precisa sair desse mundo e ser um pouco outro corpo. No grande acúmulo de poeira, eles mantêm os gestos nervosos guardados dia e noite por coelhos brancos enjaulados, maciez assustadora. Vamos gritar a necessidade de entender as razões que não são nossas, vamos assombrar e ficar com a cara para baixo em um pedaço colorido da úmida íris.

Sente-se, aproveite a nossa refeição étnica, coma em algumas feiras carroçadas e experimente uma medalha brilhante quando estiver em estado de sorriso no espelho. À medida que as câmeras clicam e fazem grandes negócios felizes, saiba que você acabará por governar as colinas: apenas roube um avião de combate.

Mas você está cansado, assim como um proletário. Pegue um ônibus sujo e mantenha-se limpo para a viagem. Recoste a cabeça no topo do sofá quando for já bem tarde, e tente se afastar esta noite. 

Estou me sentindo sem coração, estou me sentindo odiosa. Você se move como se eu quisesse consumi-lo com os olhos e água quente.

Hoje a noite, eu sinto o sentir mais, você respirou, então você parou, eu respirei, depois respirei você. E esta noite, hoje à noite, aquela noite, eu devo ignorar o bastante óbvio.

Esta noite será melhor tirar os sapatos e descascar alguns tomates.

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Deve ser um alívio sair sem ser fotografado

Quando eu vejo você tão céu quanto eu poderia imaginar, não da maneira que explode as nuvens, me faz querer tentar. Cada um de nós, com efeito, por pouco que se observe a própria consciência, quis desistir em algum momento. Bem, eu gosto de fazer viagens que estão fora do caminho, essas experiências de cinco estrelas em movimentos de várias intensidades, ora violentos e tumultuosos, ora calmos e regulares da nossa própria vontade. Às vezes o que sinto começa a se misturar com a realidade. De repente, há uma estranha linha borrada que desaparece e começa a cercar sua vida de uma maneira muito real e rara. Isso não aconteceu comigo muitas vezes.

Não quero caos, eu realmente quero ordem. Eu realmente quero isso muito bem, talvez uma nesga do éden, e sessenta e seis dias de prazo para que eu consiga criar um novo hábito.

Elementos próximos tendem a formar uma imagem única, tentemos enxergar o simples. Completemos instintivamente os abstratos espaços vazios para que sejam compreendidas pelo nosso olhar. Deficiente, eu posso estar bem sim. Eu acho que não é um bom dia para morrer hoje, sussurra. Você sabe que eu sinto vontade de voar, onde as estrelas brilham, eu espero que eu possa ser assim, querido.

É cada pequena coisa em seu lugar natural sim.

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Eu estava procurando uma saída

As coisas me afetam profundamente às vezes – muitas vezes.

Nesse sentido, as palavras expressam também incertezas, surpresas e algumas indignações. Tenta um caráter mais polido a algumas afirmações, e pensa que suas asas podem estar muito quebradiças, convidando a compreensão de uma perspectiva não tão demasiadamente humana, especialmente nesse agora quando.

Cometo um erro.

Eu vi um pedaço de luz aparecendo, de repente desprendida, um pouco antes do sol a sobrepor. Então eu comecei a olhar as coisas de maneira diferente, alimentada com poucas pílulas tranquilizantes de meias verdades. Não parecia com a lua, ficou melhor quando o tempo passou… Não sou tão difícil assim – e muita coisa foi a pressão que eu pude colocar em meus próprios ombros. E qual é o medo principal? Medo da morte. Não há nada a temer. Usando o lado positivo disso, há essa euforia do coração disparado para a vida, você sabe, eles dizem que a ansiedade é emoção em estado puro.

Então, se você respirar através dessa efervescência, torna-se uma ação forte, viva. Há muito que se pode fazer com isso. Não se pode legislar sobre como as outras pessoas vão reagir ou sobre o que elas deveriam refletir. E nunca se saberá o que fazer com essa memória, a espinha gela.

Não havia nada que eu pudesse dizer.

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Reboco

Ele também faz coisas (aparentemente) simples como atravessar a sala, apagar e acender luzes. É impossível separá-lo do que ele se lembra. Tem sido assim. “Quem conheceu o oceano? Nem você nem eu, com os sentidos terrestres, conhecemos a espuma e o aumento da maré.”

É perfeitamente possível – de fato, é longe de ser incomum – ir dormir uma noite ou acordar uma manhã depois de uma noite febril, e de supetão conhecer toda a verdade da vida e descobrir que o eu (um grande costurado com muito esforço) é todo trapos sujos. Há de se ter um trabalho de cautela. Quando se levantou já não chovia. Entre inalar e exalar, ou simplesmente caminhar através de um jardim, a data comemorativa desapareceu. De onde você é? A memória que é matéria-prima para se construir novamente, desalojada de algum recesso empoeirado – vinhetas e vislumbres de pessoas, tudo dizem e pouco dizem sobre a sua estrutura.

E os estados de ânimo – em uma extensão literalmente inimaginável, dependem de quão vívido o que um dia foi, mora na nossa mente. A insistência no que era habitual é um sentimento total, é combustível, faíscas e impulso. Mas nem sequer se pensa nisso na sala arejada e iluminada quando ele volta com o café coado, pães torrados e pasta de amendoim. Ele precisa se sentir em casa imediatamente. Controle e delicadeza nas ações e uma altivez no valor próprio.

Você não quer seguir? Ele pergunta.

Aceito o convite. O tempo parece também enterrado em nós, mas onde?

 

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Concha

Você afunda e abaixa a cabeça na roupa de cama… Você especula sobre o luxo de se esgotar toda a existência ali, um pouco. Como que em uma concha fofa, o conforto de se sentir bem, sem precisar mexer para nada, dura pouco, mas é bom. E o tempo todo consciente do calor delicioso, de como você sente você e você sente e novamente, novamente sente.  Esse pensamento acolhe e irá reunir uma multidão de outros a lançar sua tez durante a hora do seu despertar.

Quando minha cabeça está oprimida e um calor seco e febril irrita a pele e o sangue, de modo que cada toque e qualquer som pareça com um ferrão de escorpião agudo, imploro para que me levem à pedra primeira (ou qualquer outra) do sono. Lá deixa-me acordar das ondas e da fúria da brisa do alto. Essa brisa é cura e aleitamento, esfria a minha testa, acalma meu cérebro. Posso abrir os olhos e todo o resto parece estar quebrado, apenas uma pitada de queda no ar e a umidade toda levanta-se. E é como se alguém tivesse colocado um grande manto pesado em meus ombros. Não posso mais olhar onde a luz é mais brilhante, na fresta da cortina, que os olhos estão areia e a boca seca.

Você se encontra, por algumas horas, bem acordada nesse reino de ilusões e contempla as paisagens maravilhosas. Existe um entardecer na solidão das noites em claro e em tudo o que disser então. Todas as mulheres em mim estão cansadas. Apenas esperando o sol, apenas como seu cigarro queimado. Quanto à solidão – você nunca poderia saber o quanto do amor e da companhia diminuíram sob esse efeito.

[…]

Se você pudesse escolher uma hora de vigília fora da noite inteira, seria isso.

 

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“Na falta de uma melhor”

O político bêbado sapateia na rua onde as mães pretas choram seus filhos perdidos. E os salvadores estão profundamente adormecidos.

O contrário da coragem não é covardia, é o desânimo, ao menos em francês. Espero por você enquanto bebo em minha taça quebrada, e peça-me: abra o portão. Roía os nervos. São dois elementos masculinos, voltemos ao cavaleiro de espadas, converse com o porteiro. Não tenha medo de olhar pra ela, algum olhar. Não use seu poder e sua agressividade para realizar tal tarefa, elas podem te afastar das delicadezas afetivas, no que tudo isso realmente importaria. Se nos comportamos tão previsivelmente, onde está o livre arbítrio? As flores secas bem à sua frente revelam o quão desconcordado de seus sentimentos está. Ontem, seu filho dançava com seu traje chinês e suas galochas. Ele falou comigo, peguei sua flauta e dancei também.

As trombetas reluzentes prateadas dizem que você deveria recusar-me, bem vejo. Não precisa mais perguntar, tudo está dito, a dúvida é legítima e os gestos também. E a resposta é dada no momento em que se faz a própria pergunta, ou a pergunta de outrem. (Um jogo). Mas acima de tudo, não poderia chegar de mãos vazias. Você pensa como um chicote nas costas de um cavalo, estende até o limite em que o outro se quebre, tombe ou se dilua. Altero a voz, grito, engasgo. Saliva grossa, o que foi dito? Cadê a frase? Agora que a tem, o que fará com ela? Pouco importa agora, já a arquivei no sótão. Sem reclames.

A culpada suspira, cada célula daquele órgão solitário chora agora.

Se você acreditar, você pode se convencer. Tenho certeza que você pode convencer-se. Um dia poderei jogar meus remédios fora, quando finalmente perceber que não há do que se curar.

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Aguaceiro

Uma catástrofe em câmera  lenta e um dilúvio se anuncia. Música silenciosa. Segue e vai, ouve ao longe. No começo, a luz constrói texturas profundas e densas nas nuvens que pendem ominosamente acima das nossas cabeças, mas quase não provocam o ar parado. Alternar entre altitudes mais altas e baixas à medida que o desejo de capturar diferentes correntes seja intenso, e pode-se mudar sua direção final diante de um percurso que é constante.

As melodias estão ausentes, e isso resulta em música aberta.

Uma oferta deve ser considerada e se a improvisação não desencadeia o reflexo de um pequeno tremor em uma pessoa, apenas poderia ter sido uma vida, um passeio. Está longe de ser barulhento e imprudente, as vozes se calam no que nem precisaria ser dito se fôssemos fortes o suficiente para exercer a leitura para além das palavras bonitas por hora ditas. Imbuído de uma austeridade pensativa que nunca evitaria a beleza, o outro move-se onde não almejaria estar, talvez não naquele momento. Movediço presente.

A atmosfera está aberta, luminosa. Mas também é, inicialmente, um pouco pesada, com a aproximação da chuva. As gotas frescas chegarão a qualquer momento, e a jaqueta ficará encharcada dessa vez. Vapores leves e registros congestionados, um azul profundo e um cinza obstinado, oferecendo uma impressionante gama de tons. E um novo lote de arrepios força as pálpebras e lentamente escurecem a visão, enquanto o vento chicoteia o cabelo. É o movimento em sua quietude e a sensação de isolamento, de uma maneira mais profunda – de uma noite calma em vez de um quase-mudo-criado.

Não há nada para desordenar ou desbloquear o caminho do que poderia ser ter sido possível. A música é infinita e tão larga como o céu pálido. É possível sintonizar os sentidos, e por instantes desligar os canais ruidosos no aparelho de televisão da mente. É o primeiro passo, a transição da imprecisão para uma linha direta.

Nada está acontecendo. Tudo está acontecendo.

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Interior

Será que queremos então chegar em algum lugar? A gente se reconhece, mas ignoramos isso. Instinto de sobrevivência, ou vontade de permanecer na alegria. Uma necessidade, não uma possibilidade…

Atina para mais do que uma afeição, podemos estar todos perdidos. O corpo feminino obra, suficiente, é uma questão que se faz insistente. Deixe-me andar por esta estrada, insisto. Encontro você atrás da estação, me guie de volta pra casa, poderemos chegar tão longe, já avisto as luzes da cidade. Não voltemos agora.

Houve um tempo em que você me dizia segredos, ninguém sabia. Contava sobre o corpo,
que é calado, afetado, alterado, violentado, destituído, odiado, silenciado. Mas você estava com medo. Nós costumávamos fumar e assistir aos aviões pousando. Fazendo-nos graça, como política, como ato. Exercendo a posse sobre o próprio corpo. Coloque seus braços em volta de mim, olhe de perto minha pele, intenção.

Então não se engane, não se engane. É você bem ali, bem ali refletido no espelho.

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Tola

Uma ausência prenhe. Existe uma palavra em japonês para isso, Ma. Não sei se é. Essa é uma pergunta difícil. Perguntei esta pergunta e não sei qual é a resposta. Eu me sinto feliz por estar fazendo isso, sinto-me feliz em poder pensar sobre as coisas em que estou pensando e criar algo fora delas, mas não sei se eu vou melhorar por causa disso ou qualquer outra coisa. Ainda mais, de uma maneira estranha, não quero nada de exagerado e de certa forma, isso me parece quase puro e mais do que precioso.

Eu ainda sou a mesma pessoa. Mas é uma vida.

Talvez, nos vejamos – pode ser com algumas bebidas, taças na mão, ruas estreitas, passo lento. Quero planícies, luz completa do sol, ar fresco. Eu diria que eu sou muito incansável e estou sem medo. Precisa-se ter resistência e uma pele muito grossa. É difícil ouvir as pessoas explicarem uma e outra vez porque seus elementos não funcionam, porque eles não acreditam… É difícil ouvir “não” quando se está apenas tropeçando pela vida. O tempo todo.

Pode ser imperioso que se tenha o estômago necessário para assimilar o que ficou insustentável de se fingir, o que se (re)existe/iu. Se você acredita ou não em regras torna-se indiferente, o baile segue. Penso que provavelmente há exceções a tudo.  Onde estão as lágrimas de ontem à noite? Elas se sentariam ao meu lado em casa e isso seria real, de alguma forma. Ninguém mais poderia fazer isso por mim.

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As coisas que ainda enxergamos

A mulher engoliu sua raiva e firmou nos seus conceitos, não é fácil se transformar. – Eu sempre tento tirar os pensamentos maninhos do caminho, dizia. 

Penteava os cabelos na frente do espelho, com calma. Manhã fria, rosto triste, olheiras, rugas. Existe uma bonita vulnerabilidade na feiúra dos olhos opacos, na exaustão. Sentia uma espécie de abandono, uma espécie de ausência. Parece uma ausência, mas de fato, quando existe esse vazio, é que falta pouco para voltar a ser o que se era. Mas as mãos também são importantes para se manter com a cabeça fora da água. E então os lábios, a boca acompanham.

Carrego uma ratazana nos ombros, para não esquecer que mulheres se salvam sozinhas. Torço para que essa noite tenha companhia e que consiga me embalar com o cheiro cheio de outra pele. Penso em uma foto e eles têm os olhos fechados ou algo assim, e por um segundo, tudo me pareceu importar. O corpo todo coça, avermelha, grita. Você já viu tudo, exceto o que acontece quando você chama.

Eu não consigo ficar quieta, eu não consigo ficar quieta.

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Vou tentar sonhar de novo

Eu estava em casa na cama quando acordei no meio da noite, tudo pulava por todo o lugar, sentia que a casa estava caindo aos pedaços. À distância, quase pude ouvir loucas sirenes, como no fim do mundo, sirenes e pessoas a gritar em um megafone. “Não deixem suas casas!”

Tenho certeza de que foi um vislumbre de quando o mundo irá acabar. Qual dos mundos, amor? Alguns acabam outros ficam de pé. Você anda por aí com um rasgão no ombro, dolorida. Sempre sinto que o passado informa o que acontece no presente e, simplesmente, não sabia como iria acabar aquele entorpecimento dos sentidos porque eu estava escrevendo e minha garganta estava seca. Todas essas letras malditas insistem. Hora ou outra aparecem vizinhos para conversar, esticando a verdade para torná-la engraçada ou algo assim, mas no final, sempre preciso me sentir real.

Não venha com a expectativa de vencer um embate. Círculos afetivos são quinze, distância correta. 

Eu sempre tento tirar as coisas do lugar, porque de vez em quando se perde a cabeça. Uma espécie de abandono, uma espécie de ausência. Quando existe esse vazio, penso que a beleza do interior se destaca. Não, não penso. Mas desejo, espero, torço, apertando os dedos das mãos em pequenos nós até doerem as articulações. E então os lábios ficam mudos. Mas os olhos são de longe a chave, aguados, sem foco para perto. Fome.

Para alguma sobrevida pode-se pensar no absurdo do universo. Poderia ser um bom aspecto. Talvez queira alguma outra coisa boa, dormir e conseguir descansar.

 

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Eu sinto que vem mais das perguntas e do meu sentimento de desconfiança em relação às coisas difíceis de lidar do que de atos concretos. E nesse meio tempo você ouve o mundo e até consegue sair da sua vida corriqueira, por alguns instantes. Mas acho que quando estou profundamente imersa em descrever-me como uma novela, quase tudo cabe na palma da sua mão. É como se tudo na vida fosse interessante ou não na medida em que possa ou não pertencer ao que estou descrevendo, revivendo, proseando. 

Quer dizer que pelo menos dois dos três piores medos realizam. Bem ali, do outro lado da colina, terá mais de 30 quilômetros para resolver isso. É possível, sim. Tem casos em que as pessoas se sentem vulneráveis acreditam em muitas coisas. Encontra uma coisa ali, junto das folhas, umidade. Respostas para algumas perguntas, porque elas importam. Tudo entra no trabalho, como se levantar da cama e prosseguir o dia fosse de alguma forma uma condição. É uma modalidade de ser que está sempre à procura de algum vigor, eletricidade.

Não importa o que eu esteja fazendo ou com quem esteja falando. A mudança de fase da lua sugere uma bagunça no estado emocional. Lê-se a lua para ler-se. Algo mudará com base em algo que já tenha visto ou algo que tenha debruçado paciência. Quantas vezes eu deveria ter dito para parar, deveria ter vivido a interrupção em muitas ocasiões. Tortura revivê-los nesse aprisionamento mental. E é aí que as transmutações ficam interessantes e apenas em ocasiões muito raras engrossam a pele. E acho que é isso que eu provavelmente espero. Não temos certeza de onde, é uma jornada e é uma maneira de pensar – condicionados que estamos. E, em seguida, esse tipo de rachadura abre o verdadeiro significado do objeto.

Há um elemento de tristeza que é inegável e quando aprendemos a só legitimar uma voz, podemos perder uma história. Construção de outras existências, várias, bem-vinda de volta. Aconchegue-se e provavelmente se sentirá bastante inspirada, dizia.

 

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Boca costurada

Teve um lado sombrio, você está certo.

Os avós não permitiram muita liberdade naquela época por medo. O escuro inspira milhares de sons e desperta a ansiedade da saída. Te chamo, te espero. Que saibamos com o que nos importar em situações em que nós mesmos nos desfalecemos, perdemos o vigor e a força física. Há uma tristeza no som da voz, pouca vontade de alcançar o outro, pouca esperança. Falo para você e um pouco para mim também. No domingo à noite, enrolo nas cobertas e no sofá aguardo o frio sair da pele. Não me preocupo com o tempo que isso vai levar, tenho calma e sei que a paralisia não durará muito tempo. Risco de perder o fio da meada caso se dissipem os primeiros pensamentos da manhã, o que deve ser guardado no coração e o que nunca deverá entrar nele.

Mostre-me respeito, que não escondamos a verdade e não enterremos o passado sem resolvê-lo. Podemos redefinir nossos abismos enquanto o ar frio entra pelas frestas. Prioridades. Que a gente se aperceba que o tempo traz as verdades e recupera algumas cascas das feridas. Talvez algum conforto, alguns colos, chamegos. Que haja amor e que sempre haja recomeços, pois somos todos seres inacabados. Ah, no meio do verão, quando o sol estará alto no céu e as nuvens oferecem uma grande variedade de formas que mudam constantemente, a luz terá tornado ao que era um ano antes.

Seguremos as rédias dos nossos descontroles bem rente.

Observamos melhor essas coisas quando estamos fora. Olhos vidrados na janela, o frio e o escuro já não absorvem tanto. Algum conforto de existir, respira em três tempos. Os velhos tomam polaroids, os jovens usam o instagram. A inspiração nunca é obrigada a cumprir um prazo.

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Tornar-se pedra

Quais são as providências que você anda adiando?

Contudo, por muito tempo, tais exigências não existiam. Aconselhava-se escolher dentre os dois exílios o que parecesse dominar com maior propriedade, o que tivesse “maior vigor” ou “maior calor”, talvez ainda o “maior contraste”. Estranho que já não estou tão nervosa. Eu fico com medo de não ser suficientemente boa a escolha e preocupa o bastante, interrompido. Assusta por não ter sido verdade. Você não está amarrado às suas camisas e paletós, empurrar-se ao limite.

Passam a explorar completamente em nome do OCO que é ruído, basicamente um registro de ruído. Leve re-criação pura do que poderia ter sido um artifício que sopra os restos da ordem anterior. Distância. Fomos chamados a uma alternativa significativa nos momentos em que a maioria das pessoas está dormindo no escuro, enquanto os sortudos ainda estão dançando nas luzes. Evidentemente pega no meio,  inundada de indecisão, crescendo e desaparecendo em várias direções ao mesmo tempo, perdendo o lugar do sorriso.

Nãoo, você não precisa fazer muitas coisas. Pode ser sem sentido, mas há algo em deixar este lugar onde permanecem os passados melhor do que já os deixou anteriormente.

    Há algo naquilo que se sente bem, no fundo do seu núcleo. Eu vou com isso. E estou apenas tentando entender tudo.

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    Choro no sonho

    Você não sabe como vai fazer isso e você não sabe como vai acontecer. A realidade a todo momento entra nisso, interrompe a alucinação. É sempre difícil. Eu acho que estou tentando justamente lutar um pouco contra o que pode ser uma nova vida. É que agora é diferente porque eu sou mais velha e mais indefinida.

    Não faz nenhuma diferença. Eu ainda tenho que encontrar algo interessante dentro de cada cor que emocione. Mantenho  a sua parcial distância e disponho de pequenas barreiras invisíveis ao redor de mim. Exalo um ar de respostas irresponsáveis.

    Leva, conduz, deixa.

    Posso parecer dura e autocontrolada. Praticamente um iceberg. Sob essa fachada um sentido emocional prévio e umas boas dificuldades. Ela aprendeu a sobreviver e gosta de tulipas azuis, cantarola baixinho.

    Choro no sono e ardo um pouco. Eu executo isso como uma maneira de seguir meus quereres. Estou interessada em muitas coisas e se me permite caminhar para qualquer muro com a luz da hora do almoço e dizer: “oi, posso tirar sua fotografia?” E, portanto, “posso me tornar parte de sua vida ou você pode se tornar parte da minha?” Precipitações. Impaciências.

    Da minha vida? Talvez eu também não saísse comigo em uma noite de sábado.

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    Uma mente bonita entre os olhos

    Por esses dias só contar as horas e nós ficaremos acordados a noite toda, quero que você se sinta bem, bem. Você pode passar por uma rua e olhar para fora, algo precisa me dar uma emoção, algo precisa me trazer uma lembrança, um sonho para algum lugar. Não estou planejando, ainda estou trabalhando, mas todos somos olhar, é só termos um ponto de vista.

    Eu sou alguém que acorda no meio da noite e pensa sobre as coisas que espero. Desejo. O sono entrecortado, muito final do dia, nenhum na madrugada, algum de manhã. Amanhece e juntando tudo umas seis horas de sono… Eu tento ter uma grande vida. Visito vontades diferentes em seus ângulos cujo desenho de luz eu goste. Talvez eu faça histórias sobre o que nos escapa por não sermos tão rápidos quanto deveríamos. Às vezes eu trabalho como todos devem fazer e nunca fui a uma convenção na vida. Mais e mais eu gosto disso, mas eu poderei sobreviver.

    Você tem que lutar pelo seu trabalho – todos devem fazer. Poderá e deverá ser derrubado várias vezes e ficar-se de volta. Não pode deixá-lo ficar em seus ombros (os pequeninos diabos). Eu vejo muitos fotógrafos que fazem suas coisas e colocam sua alma e, ao final, tudo mudou-se, mas seu nome ainda estará no assunto. Mais subtração do que a adição. Todos nós temos uma espécie de máscara de expressões. Você diz adeus, você sorri, você está com medo, você enlouquece e desenlouquece. Eu tento tirar todas essas máscaras e subtrair-me de tudo pouco a pouco.

    Mesmo que uma imagem não seja tão boa, pelo menos eu posso voltar a dormir à noite e pensar alguma coisa diferente hoje.

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    É melhor sem medo de qualquer maneira

    Quais as novidades desde quarta?

    Nada de especial. Caminhos para tentar encontrar algo novo… Eu não sei. É bom escrever cercada por música e bons livros, e com uma xícara de café forte à mão. À medida que o dia continua, torna-se cada vez mais difícil prestar atenção a qualquer outra coisa. Eu tento estar presente para as pessoas que mais me importam.

    Grande parte do trabalho é no cotidiano. Tudo em você traz uma vida intensa e você, diretamente ou não, dá muita importância ao poder da lógica e então, por alguns segundos, é invadido por uma estranha sensação de triunfo com o coração partido. Sem lutas, justamente por ter voltado a viver. Tanto acontece no interior – na mente – que mesmo os dias mais comuns muitas vezes se sente selvagem. Quando um pôr do sol funciona, o familiar torna-se estranho de novo e a vida é revelada em toda a sua estranheza inarticulável.

    Inarticulável. Desejante.

    Nenhuma questão fora afrontada de um jeito elegante, e escapar desse impasse foi um movimento impulsivo para ganhar tempo para pensar. Ou será preciso dizer as coisas de outro modo? Um mestre favorito meu costumava dizer que anseia a estranheza dos outros. Anseio a estranheza doméstica, interna. A vida está confusa e quem sabe o que está por perto. Mas, em muitos aspectos, a incerteza pode ser estimulante, mente em movimento e não em repouso.

    Seria uma pena enxergar o nosso fragmento de tempo neste planeta-poeira-cósmica com medo. O fluxo para se conectar com outras pessoas através do idioma é forte, mas a vida é solitária, muito solitária e a poesia com cores fornece algum descanso.

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    Eu ainda estou esperando que isso apareça na cabeça de alguém

    Melhor. Em última análise, todos estão agindo fora do que sentem. Todas as longas linhas vermelhas que cruzam a visão à noite, toda fumaça que esmaece os olhos flui para seus sonhos. Parecem um grande mar azul aberto que não pode ser vencido. Deuses inexistentes e distantes com seus sinais desbotados, aparecem nas extremidades. De todas aquelas luzes piscando você terá que escolher uma noite para si. Todas essas extremidades sem fim, que não podem ser amarradas, me fazem chorar.

    Até caírem como moscas, os sentidos das confissões afundam como pedras polidas. Para mim é uma distinção: se concentrar na forma como as coisas funcionam lindamente ou na forma como as coisas funcionam miseravelmente. Voltear a vida continuando além do final de uma história. É esperançoso, positivoAlém disso, minhas histórias tendem a levar os caminhos do isolamento à comunidade.

    As pessoas competem quando conversam e a exaustão do processo esmorece as vontades. Areia. Para que eu seja aceita de volta por um mundo do qual fugi, perco o limite.  Quer suas contribuições se baseiem na contribuição anterior, quer se baseiem na auto construção individual, o outro é tragado. O que às vezes é algo da minha própria vida é instantaneamente eclipsado por uma versão quase idêntica, mas mais extrema, da vida de outra pessoa.

    Essas coisas acontecem a todos. Você está fora disso e de certa forma, você está fora de si mesmo. Mas há um cansaço. Há uma vontade de não pertencimento a esse jogo. Há uma vontade de existência sem a necessidade de se jogar. Seja o que for. Há uma vontade de calma, de sossego, de respiro.

    De vermelhos.

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    Eu não choro fácil

    O lugar que conhecemos, protegido e quente, perfeito na tempestade perfeita. Porque as tempestades são imprevisíveis. Exatamente, então é por isso que não queria perder tempo lutando contra, disse. Os riscos são muito importantes para mim e por certo quem irá sofrer as consequências é quem levanta o não, o basta. Mas eu sou apenas eu mesma. Quero que a pessoa na minha frente saiba que eu sou apenas humana (e que tenho medo de muitos enfrentamentos). E isso vem com confiança, acredite ou não. É a única coisa que irá, quem sabe, fazer a diferença, definir tal diferença.

    Estarei completamente obsoleta se eu não correr riscos. E essa não é apenas minha vida, é nossa, pois eu sou duas.  Na escrita, na música, na madrugada febril, você se deve.  As fórmulas e ladainhas (justificadas, isso é pertinente) envelhecem depois de um tempo e as pessoas começam a vê-la através disso. E sua covardia, aquela que te traga, aparece. Mas também deu às pessoas essa imagem como “aqui vem a luz do sol, que é boa em guerrear!” Ahn, que eu simplesmente vou, “humm, não”.

    Espero que algo especial saia disso – mas essa ideia também sugere uma natureza que não me é encarnada e que passear por minha pele nesse estado, na minha cabeça é algo dramático. Tudo marcado para os próximos dias e desejo me convencer do óbvio, do correto, do luminoso. Que algo está acontecendo posso dizer e que os passos que levaram aos meus desenhos e articulações acabados são muito pouco espetaculares.

    De início obedece ao destino sem o saber. A partir do momento em que sabe, sua tragédia principia. 

    E uma vez que você percebe isso, a vida se torna um pouco mais fácil ou mais difícil. Mas especialmente diferente se você se reconhece, ao falar com outras pessoas, por exemplo, que você não é a única. O que faz sentido sobre esse pensamento é que você tem uma determinada função de uma ação coletiva. 

    Quando você faz o tempo suficiente, por um tempo suficiente, você quer manter-se aberta. Se fechar tem sido desconfortável, pois a casca não é grossa o bastante e a vulnerabilidade é importante. 

    Há pássaros na tempestade  e vou simplesmente colocar o meu melhor para fora e segure, segure, segure. Aperte. Divirta-se. Você vai pousar em algum lugar e você também terá que se mudar de lá. Eu também gostei do alto.

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    Mantimentos

    Queria acompanhar aquela pessoa, levaria cantis e sacolas com frutas. Esperaria o sono para anular mais algumas horas de espera. A noite era fria e acobertar-se era o que se devia pensar.

    O rosto pálido e ainda tenso transparecia em sua expressão o fim de uma luta que teria ocorrido em sua vida faz tempo. Surgia daí hipóteses, vontades, metas. Talvez você se comprometa a comer alimentos orgânicos cultivados localmente, ou talvez você comece uma nova prática do ‘como você pode encontrar e manter seu centro’ – disse.  Não posso deixar de pensar imediatamente em várias experiências que se poderia ter a partir daí. Mas já que está fazendo sua própria coisa, você está em sua própria aventura, você está em sua própria missão. É quando eu realmente sinto que começo a entrar em algumas situações boas, agradáveis ​​e não-perigosas, assim quando em determinado momento da noite se levanta e começa a perceber movimentos difusos ao seu redor. Se tinha esperança naquela tarde era a de que finalmente o caminho se abriria. Então o que impediria? Vou ter que me sentar na cadeira de um analista para essa resposta. 

    Eu sei ele teve uma abordagem muito criativa para a vida. Ele não era convencional e isso me ajudou muito bem. Tento não me surpreender com os personagens loucos com quem se a gente costuma se envolver nesta vida. Seu lema era: ofereça os poucos alimentos que dispõe. Ajuda mútua. Não importa se você bagunça; pelo menos você está tentando algo diferente. Alguma desistência que fosse feita no escuro incomodaria naquelas circunstâncias. Precisamos de todos, insistia.

    A noite não foi ruim, estava o ar frio, muitas estrelas, um quarto de lua, uma vontade de encolher-se enquanto esperava pelo pálido do céu quando amanhece.

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    Polaridade

    Acordou hoje de manhã para descobrir uma miçanga perdida em um dos cantos do quarto, acordou hoje de manhã precipitada e desvairada. Inerente a todas as coisas, o filme-carta passou diante dos seus olhos. Em face do desconhecido e do horror do dia a dia que terá de lidar, jornadas frutíferas, trocas valiosas e ajudas espontâneas fazem o brilho dos dias. O objetivo todo deveria ser reconhecer e satisfazer a natureza sonhadora da existência, qualquer que seja ela. Há mais resolução, mais brilho, uma clareza, uma sensação, uma dimensão.

    Confiante naquilo que descobriu na solidão de um não-sono, quis se envolver com o pós-amanhecer com alegrias e águas. Eu cresci católica e minha mãe permanece até hoje realmente motivada por essa religião. A crença nas multidimensões é apenas um formato, um outro formato, não um questionamento. Porque eu acho que há um peso para o processo de pensamento religioso, uma espécie de peso emocional. Como você se sente sendo sozinha? Como você se sente sendo repetidamente substituída? Eu trago pra você pequenas explosões, ouviu ao longe.

    Eu não vou chamar de profundidade o que implicaria em monte de outras coisas, mas certamente há uma espécie de amarras sobre isso. Como quando você não é necessariamente destinado a se divertir muito nesse mundo, enquanto os dramas estavam em preto e branco. Não mais mitificar e oferecer respostas. O que é mais perigoso é quando construímos uma mitologia qualquer para dar respostas e ditar o significado e a existência, e então oferecemos essas imagens como precisas para mitigar todo aquele pavor que sentimos. Parece que em nossa cultura o objetivo é nos fazer sentir mais aterrorizados e menos confiantes.

    E, claro, com dois olhos, você pode simplesmente assistir ao mesmo filme de forma diferente.

     

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