O homem pela primeira vez aparecia em movimento naqueles dias

Um achado: começa com um vagabundo na rua, velhas roupas, velhos sapatos… mas é sempre essa tristeza.

Urgente, emergencial.

Presságio de um momento de batalha e muito esforço, tudo interfere em tudo. Um recolhimento para fôlego para nova aproximação. Fato que está por toda a parte. Ilimitado, indefinido ou infinito. Gostava de acreditar que a realidade última era sem fronteiras. A destruição ocorrerá na medida da necessidade. As lágrimas vêm aos borbotões.

Infinitos mundos.

É urgente. Era urgente então. Será que saberemos enfrentar tudo unidos? Sentiu-se bem. Amor e guerrilha. Objetos, coleções, guardados… isso tudo traz algum espírito de felicidade e um presságio de conquista de boas relações. Afeto. Assim tudo tão frágil no horizonte. A vontade é de firmeza de dentro do dentro.

 

Está tudo nos livros.

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Laurent Chehere, from Flying Houses series

 

 

É sempre dias de chuva por aqui

A água está quente.

Gosta de jipes antigos. Gosta de trilhas sonoras de filmes espaguete. Gosta de truques simples.  Um bom dia para a lucidez e a organização do caos emocional que quase sempre nos colocamos… acabado. Os tipos encontrados ao examinar as minúcias da natureza através de um microscópio são exatamente assim. Com que frequência?

A regularidade das batidas entrecortadas pelos cliques no teclado, cortadas com a precisão de um metrônomo.

E o ritmo calmo convida ao sono. A chuva faz tudo melhor. O vinil verde, a musicalidade apertando o coração, a sensibilidade de garagem e a rocha bruta. Mas, por pura diversão neste inverno, este é o único poder a se obter. Cordas tristes são colocadas em cima de um piano antigo.

Usar o cantar como âncora de profundidade. Com dois ‘sunrise’ acumulou mais poeira do que poderia imaginar. Enquanto cozinhava voltava à vida. Requer outros dons de si.

Divide a respiração em quatro pedaços iguais. Em mim. Leve e ofegante estaria. Esse parece ter sido o sabor do mês.

É sempre época de chuvas aqui.

 

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Olha aqui

Sobe as escadas correndo e aos brados grita: porra nenhuma! Tem hora que é na base do grito mesmo. Vem pensando na finalidade de se fazer entender… A ideia é saber das tendências antecipadamente para evitá-las – elas não precisam ocorrer afinal. Num panorama mais realista do dia a dia tenta seguir, mas sabe que todo exercício da memória é ficcional.

Quem sabe não ser atingida por um golpe de sorte ou por uma farta generosidade alheia? Recorda os dias anteriores enquanto relê as conversas, revê algumas fotos, ouve músicas. Elas não são mais em si, mas em relação a si, assim, num poderoso componente racional. Mas tenta recuperar a origem e responder algumas questões… foi a falta, foi o excesso? É claro que escrevem o que podem, não o que querem.

Perde muito tempo ali a desdobrar passados, resolve-se pelo café e uma bala. Respira fundo e decide prosseguir com seu dia. Quando sai é pega pelo sol, lindo e escaldante.

Ganha um abraço, sincero sim, mas permanece de olhos vidrados.

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Helen Levitt, New York 4, 1972

 

Não ser o que se falta

Andava muito nervosa ultimamente.

Expandindo os sonhos para onde nada importa muito, eu me olhei sem espelho: um clichê acerca da integridade própria. Com aquele tom confessional de intimidade (como questões de viver e pensar no real) dei voltas para que a saia rodasse. Num gole de café, boca vermelha, boca miúda. Resolvi pelas novas possibilidades afetivas para que, quem sabe, pudesse cultivar o amor. O trânsito entorpece, mal percebe o caminho, tudo diferente.

Segue mesmo assim, e lentamente, percebe que um dia (outro dia) irá surtar naquelas paragens. Mas nada disso beneficia diretamente essa torrente de lágrimas que transbordam, naquele geladinho que alivia as bochechas quentes, já que no sonho fazia tudo certo. Mesmo assim guia o carro, mecanicamente. Sem tempo nem lugar pra lágrimas. Novas escolhas, viva! Novas tendências, viva, viva! E sem aqueles constrangimentos e necessidade de arrependimentos (!!!) era seu futuro escolhido. Queria amar em outras circunstâncias, de outros modos, outros modos. Agora é seduzir. Alegria e baixas expectativas, onde os re-sentimentos fossem sussurrados. Nem a fibra que me falta, nem as palavras, nem a amorosidade.

Não ser o que se falta, começa por adquirir novas qualidades (sem juros) pensando no que poderia dar profundidade a cada uma de suas almas nessa vida. Coisas que jamais sonhara esclarecer com calma, limpar, polir (a alegria sempre acha o que quer) no campo do corpo físico diante de algo que ainda está por se formar.

Uma nova felicidade, pequenina, no banho de sol, um casamento legítimo, sim, vai. Qual seu sexo? Masculino.

Um pouco de sol nas mãos. Assim ficará melhor.

 

 

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Cansando-se e desistindo

Não acredito que você fez isso… Em uma mulher truculenta e autoconfiante, isso que você se transformou.

A fase dos gritos,  berros e atritos havia passado, mas a rigidez veio como um ato de resistência. Isso você consegue fazer muito bem, seguir em frente, né? Ela quis conhecer ‘seu’ afogado (sobrevivente de um maremoto) graças ao poder da intimidade verdadeira. Quis mostrar como ser firme e decidida, que não há nada que supere a persistência, que as águas só… são.

Reconhecia o significado do silêncio e da quietude, e não descansou enquanto não percebeu que você aprendeu a observar intimamente – sem um constrangimento tão típico. Engrossas o couro, já ouviu essa expressão? Pois é isso. Couro grosso. Pele grossa. Cascuda, como me chamam. E ele sempre chega por trás! E basta o despudor ou a coragem para conter-lhe, que fosse simplesmente se curvar para aceitar a existência. “Eu não acho que eles têm amor”, digo, olhando para os pés.

A notícia foi ignorada. Arremessada contra a parede, sangra na testa, e novamente sangra pelo não entendimento, forçando um novo golpe. Uma armadilha, deveria ter previsto. Mas nem com toda humanidade dentro de si isso seria possível.

Droga. Outra cicatriz.

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Helen Levitt

 

 

 

 

Bored and naked

Contando que não se faça de preguiçosa e que me adule infinitamente e, claro, que fique no seu lugar.

Mas que lugar é esse?

Mas que pergunta! Só podia vir de onde veio mesmo! O lugar de sempre. Precisa explicar mais? E o que é que vocês queriam? E não me venham agora querer coisa diferente afinal, fomos educados assim (por vocês, by the way). Aí você também não está ajudando não é, fica aí com essas roupas, esboçando sorrisos e auto confiança, fazendo o quer… ora vá! Agora aguenta. E por qual motivo essa cara de infeliz? Pegue tuas revistas cheias de dicas de como ser feliz, linda, valente, inteligente, gostosa, doméstica, profissional, paridora, engraçada, gata, já falei gostosa? Não? Gostosa. Principalmente, seja inteligente sem pensar muito, aprenda as dicas de como deixar a pia branquinha e cheirosa, enfim, não sei de tudo que tem nessas revistas, mas pegue-as e vá se divertir. Com cara de bosta, deprê, cheia de pulsões melancólicas ninguém aguenta. E vá caçar serviço. Se não tem, te arrumo. Mas o que é isso? Vestir como quer? E não me respeita, não respeita meu desejo irrefreável de usufruto?

Mas o desejo é seu!

Mas o quê é isso? Claro que vocês são responsáveis pelo meu destempero, meu desejo de posse. Você se porte a contento, como um bibelô. Isso, um bibelô. Ô gente, mas ainda não entendeu? Mas é burrinha mesmo, né, olha: eu te possuo, eu te possuo. Se não te possuo, só de existir e sair por aí fazendo o que te dá na telha fará com que eu te possua, mostra que quer ser possuída, entende? Claro que posso invadir. Mas isso é só lógica! Do que adianta não saber fazer alimentos? Prepará-los com carinho e amor? Não vê o privilégio que isso é? Ahn tá, pode sim, trabalhar fora pois é importante não é, mas se desdobre então, e não vai ficar aí se achando com esse empreguinho. Coisa mais cafona. Quer uma coisa e não a outra? Não leu a revista não? Ninguém lá reclama de nada, todas lindas, gostosas (já falei gostosa?) e felizes. Aprenda. Mas porque você está desejável? Tá querendo o quê com isso, não me respeita! Tá difícil sua vida? Mas até que isso que você fez é legal, é bacana. Mas porque você precisa me deixar de lado para fazer isso? Isso lá te preenche? Eu te preencho. O resto é… é… entreterimento. Não leve isso muito a sério. É só piada, não vê? Nessas revistas não ensinam ter humor não? Ahn, já tá gritando, perdeu a esportiva! São todas histéricas mesmo. Ou é TPM. Começa gritar já sabe, ficar revoltadinha, é TPM. Batata.

Mas isso sou eu.

Mas é assim que tudo funciona, não vê? Ahn, fica aí com sua dificuldade. Mas você sabe que essa sua dificuldade é pouca coisa, não sabe? Adora reclamar de barriga cheia. Me deixou de lado? Sua punição será ficar pra titia.

Qual o problema de ser titia?

Não leu? Só vale alguma coisa se tiver EU do seu lado. Como não é pra me agradar? Eu estou aqui com meus problemas existenciais (já falei pra nunca deixar de ser gostosa?) e você aí papagaiando. Puxa, não tenho paciência. Além do mais, competem entre si. Hahahahahaha! Deve estar lendo besteiras na internet, só pode.

Mas ó, mesmo assim eu fico do seu lado, viu, sou super bom. Mas que seria respeitável da sua parte vestir melhor, bloquear homens no facebook, me acompanhar, me amar, me mimar, me alegrar sempre, isso seria. Esse assunto já cansou. Burrinhas mesmo. Fica pelada logo.

 

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Quereres

Queria fotografar minha própria pele por dentro, a queimar, nervosa, a coçar, alérgica, com vermelhos, erupções, sentidos. Sonho sempre contigo, na maioria das vezes, acordo às gargalhadas. Queria conversar contigo sobre o Valter, sobre o Rosa, sobre Cícero e Wado, sobre as mazelas impoliticáveis desse nosso mundo, queria rir, ouvir e ser ouvida por ti. Sobre full(s) album(s) (ou  não), sobre palavras, sobre amar o ofício. Queria cuidar de ti também, alisar sua tatuagem enquanto fala da solidão de existir. Queria ouvir você, queria te ver todo dia. Queria ser eclética ao seu lado, ouvir e ver Céu. Você me cuida. Queria conversar das flores na janela, nas garrafas, dos sentidos maiores de tudo. Queria que você sentisse ternura pela criança, que perdoasse essa minha tosca capacidade de crueldades cotidianas. Queria chorar junto, compartilhar vergonhas e fracassos. Desfrutar contigo alguma paz, algum êxito de algum projeto de algum tempo de alguma vida. Queria a verdade entre nós, conversa solta, real. Queria a não mágoa, a mundana vontade de estar perto. Queria a carne queimando perto de ti, e sentir de novo meu coração sair pela boca quando te vejo de longe, e sentir as bochechas queimando, quentes por estar perto de ti e sabendo que estás a me olhar. Queria poder mudar todo dia, ser outra a cada instante, ser instável, despenteada, unhas com os cantinhos sujos e aquele cheiro de alho nas mãos depois de cozinhar. Queria poder sentir esse conforto da não perfeição ao seu lado. Quem sabe poder peidar, arrotar, tirar meleca do nariz, quem sabe te ver fazer isso e achar graça, queria essas alegrias pra além do gozo que arrepia.

 

Mas também, quem disse que a gente pode ficar querendo coisas assim? Pode nada.

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Tudo bem, Zé?

Tudo bem? Ahn? Sai daqui ainda não. Calma. Um minuto de ausência é muito, vai fazer diferença no final. Reformular velhas crenças, quando se é mais generosa. Possibilidade de se expressar sem ser fuzilada ou aquele velho problema de ser não-compreendida. Amanhã a gente se vê aqui, na mesma hora? E o Gabriel? É, ele está aí, Zé. A mãe disse que vinha buscar… Ouça aqui, velho homem em corpo de menino bonito, escute bem, há amor no ar. Existe o bem querer e existe a vontade de querer ficar junto, ali, né, Zé? O que você acha? Seria possível mudar? Aponte o dedo para seu velho coração, ali, bem no meio, um pouco pra esquerda. Aponte e desfira um golpe certeiro. Zé, ô Zé, tem um caído aqui, corre! São os efeitos colaterais, já sabia que isso aconteceria! Ela sofria pequeno (engraçado sofrer pequeno) quando ficava longe do olhar dele. Mas nunca entendeu isso direito. (Aí, vem a tia e aconselha… Você tem muito de mim, sozinha demais. Eu só fui ceder à uma paixão com quase sessenta anos! Ceda, ceda… ) Ô Zé, ela não está respirando, não seria a hora de procurar ajuda? Ruidinhos e texturas nos murmúrios. Aliás, ela não tem lugar de permanência, vazia que estava. O vazio é claro, barulhento e cheio dos sentidos muitos. Gente, mas o combinado não foi que o momento era de espera? Não? Como não? Era sim, era sim. Era pra ser assim. Era pra não ter mais dúvidas sobre si mesmo. Ei! Abre a porta! Pode entrar, só está encostada. Tem cor aí dentro, em cima da mesa.

 

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Tombos

Quanto maior a altura, mais longa a queda, dizem, né, não dá pra ter tudo (carai sô!). O que lhe atormenta neste momento? Segura, aperta, dá um nó. Faz um bem danado depois que passa perseguir uma tendência a expor suas fragilidades mesmo na correria… Elas estão exauridas por seus trabalhos hoje. Então, calma. O fator histórico torna complicado a estadia sadia por lá. Procura um abrigo para si e seus delírios, um porto seguro, dos bons, ainda que imaginário (alguns livros pra ler, algumas letras pra escrever). Muito embora possam incomodar bastante, há a vantagem de serem livros que esquecemos (ou o corpo, ou a mente) caso isso seja necessário.  À medida que lemos. Quando terminamos, só nos resta recomeçar um outro, o próximo. Exercício da importância das diferenças caminhando no incerto e idolatrando a dúvida (já foi dito isso aqui), buscando estímulos mais curiosos a fim de aprimorar a capacidade de espera. Os escritos ficam lá do lado dela, bem visível, pra que não caia na tentação de se esquecer deles. Para entender que nem tudo é possível  ‘aprender a romper com ilusões e mentiras’. Pareço um brownie ‘sensual’ com espuma de maracujá para o dia dos namorados, só que com alguma coisa que se quer realizar.

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Qualidade cortante e fria.

Pleno de cor, a luz que sugere o florescimento da beleza, sugere também o que é interpretado por uma melancolia em toda sua capacidade quase infinita para perguntar. Ainda não encontrou paz no silêncio, clama por palavras, sempre foi do verbo (anotação mental: aprender a língua das não palavras). Em uma conversa vêm lhe chamar a atenção para a importância da autoestima, do cuidar de si, da aparência. Importante é, mas, na verdade, não entendia muito bem o que era isso. Se sentia única e por isso mesmo, diante do não entendimento, o mais recomendável era ficar na sua. E se, e, se você der um grito durante a noite, e ofegante perceber que tenta desmontar a sua verdade com quatro vulgaridades, desista. E os pesadelos? Dará conta deles também? Eles que pendem como uma criança e não deveriam ser  levados sério. (Expressivo é som),  que lerda, dificilmente será capaz de convencê-lo de que precisa ser tudo isso, e clama por uma compreensão da incoerência. Eles não têm ideia, de que todos eles “têm é serragem dentro da cabeça, você me entende? “. E os gritos noturnos acabam por se tornar um “fenômeno” curioso, de uma forma mais intensa, como se simplesmente alguém estivesse lhe emaranhando o cabelo em um passado amoroso. 

 

 

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Com um sorriso agradecido e uma postura casual

Porque nada nas águas da ilusão sem fim se impulsiona a não ser ou encarar os pontos da própria alma que tanto incomodam (para um escapismo imenso). Onde os devaneios dormem, na trêmula e leve sombra saudável do sol. A imaginação alimenta nossos olhos, sem causa aparente… (profundo ressoar da sua parte). Mas isso pouco importa agora. Com emoção nada intensa, quase a  virar melancolia, aquela molenga como um “aperto no peito”, a qual quase já se acostumara.

A cor suave de verde é conhecida e feita para ajudar a restaurar física e psicologicamente os feridos, limpando a sujeira dos dilemas da vida com sua serenidade acolhedora. A cor ajuda a desacelerar e bloquear o escândalo do vermelho-sangue, vivo. Um pouco de morte acalma. Acumula…

Vulnerável e receptivo a tudo que vem de fora… cada gesto é lento, embora nunca estagnado. Estático, ou extático. Um quase erro querendo contar a sua versão da dor do mundo… algumas mortes, disco zen na vitrola. Ar e vida. Você pensa com muita incerteza a respeito da eficiência desses movimentos, com equilíbrio, harmonia. Mas isso pouco importa agora. Investigando coisas ditas (principalmente se o caso é que a nossa percepção de segurança é apenas uma falsa realidade).

Silêncios precisavam de atenção. Mas pouco importa agora.

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Insuportável peso

Era quase inverno, mas mesmo no quase, ainda não era, e o processo construtivo, a concentração e o esforço diários… mas ela congelava. Tanto que seus ossos doíam, principalmente seu pescoço e ombros, na esperança de que o tensionamento e o nervoso aquecessem. De alguma forma isso a pesava, a mantinha na mesma posição, imóvel, endurecida, consistente. A imagem mostra como ossos podem pesar no dentro da carne, como chumbo (chumbo: à temperatura ambiente, o chumbo encontra-se no estado sólido). Aí fica imóvel. Grave. Séria. Qualidade invisível e não se tem controle sobre ele. Muitas vezes provocando uma resposta social. Sempre significando alguém com o peso da existência. Então, num repente de atividade, se movimentava freneticamente (acessível em todas as suas formas) para produzir algum calor. A busca (cruel) pelo etéreo…  Ela só queria o gostoso, o quentinho.

Não presta pra comédia. Podia ter gosto de cereja pelo menos.

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Antes de qualquer coisa

Para deixar claro que as mais procuradas eram aquelas palavras, por assim dizer, que voluntariamente fariam esquecer muitas recordações do passado. De se abrir mão de prazeres (mesmo que em recordações) (o que não são capazes de fazer algumas imagens lembradas, hein). Esquecem que o resultado natural de uma alma é o desejo. O abandono de ver a imagem que reflete um passado quase recente acaba por fazer mentir a nós mesmos (e quiçá nos agradar) — um trabalho incansável de engano.  Ahn! Que não faltará uma legião de “bons conselheiros” querendo se meter na sua vida com nossas próprias mãos! (Mãos, só as minhas). Agora é possível dar uma reviravolta (suspiro), se lhe apetecer. (Caí nos meses passados mas estou inteira, só com um pouco de dor) (desconstruída, descabelada, amarga, sedutora, ameaçadora). Emocionalmente menos estável — síntese de um corpo ancorado por pura angústia, pressa. (Lembrando do que passou você merece o amor). Aquilo que evitamos não deixa de existir (pudera que assim fosse), apenas passa a atuar de uma forma mais sorrateira. Aí sobrevém: acontecer depois de (outra coisa) o desejo de (re)existir.

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Ou a ausência dela.

Interfono e peço para o zelador para deixá-la subir. Aconteceu e aconteceu. Não se pode fazer mais nada. Sem querer comentar se conhece outros envolvidos, Evans foi quem deu início ao que hoje deveria ser lido por todos os condenados à prisão perpétua (por reais ou imaginados crimes). Todo bem quase pode ser alcançado enquanto ela dizia que ‘cansei de pensar em você’. Do silêncio (a falta de som) é que veio a ideia. E sempre de maneira suave e calma, a ordem era tranquilizar-se e produzir em seu melhor estado, em algumas situações. Parecia ter sido atirada bem em cima de minha cicatriz mais sensível, com peso de pluma. Que tudo está sempre certo, do jeito que deve ser. Foca na compreensão das qualidades e virtudes ou a ausência dela (acende cigarros de vinte em vinte minutos, quando o compromisso é somente consigo mesmo).  Ela não se arrependeu da decisão porque sabe que não tinha escolha. Cortante e frio será sempre.

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Lembranças acabam se confundindo com invenções.

Estar morta e esgotada é possível. Mas não é o idealizado por ela para aqueles dias. Que tenha ficado mais de uma hora ali, naquela esquina. Esperando. Em vão. Que tenha esperado em vão muitas vezes em muitas esquinas (porque sente que ultrapassou os limites). A experiência alcança alguma humanidade e corresponde a um movimento em direção à individualidade com força e rapidez.

A amiga disse: tenho  vontade de te sacudir! Parece que não quer ser feliz! Por favor, por favor.

Depois de colocar fogo na casa contudo, algumas “novidades” tendem a desaparecer, porque dizer a mesma coisa de outro jeito é dizer outra coisa então. O peso a prejudica no trabalho, porque quer andar. E  é a única forma realmente eficiente de nunca se perder – caminhar. Depois se acalma e,  quase invariavelmente, lá permanece esperando pela paz  recompensadora de si mesma. Como as satisfações com claros componentes sensoriais e fortemente emocionais, que embora sejam passageiras e exigirem pouco de si, é o que salva. De tudo é o que fica.

 

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Da série ‘que não sou de ferro’

Urgências de viver alguma alegria, perceber algo que não vira antes, algo que faça lágrimas bonitas escorrerem. Porque a frieza (se tanto), que resolveu se adiantar e se despedir antes de ser despedida. Dizem que tudo agora é em estado de transição (muito embora ache essa ideia muito rancorosa), em que nada é para persistir. Uma necessidade de se ocupar do outro mais onde as características ainda são válidas e úteis – a aprimorar.  Do que é convidado a perceber algo que não foi visto antes, que passou e de uma forma imprópria se perde muita energia no processo. Suspende toda sua busca, seus desejos, sem resistência. A  situação continua muito complexa, porém, (neste momento) pode fazer algumas combinações interessantes que, temporariamente, colocarão as coisas numa direção positiva. Dedica-se com afinco a esse processo. Se não o fazem por alguma fraqueza, pode-se desejar que seja por impulso.

 

 

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In all my holes

As certezas de que sobreviveriam podem ser vistas na minha escrita.  Há tinta, vinho, respiração, fumaça, desejo, consciência do presente e concentração. Fazer escrita é uma prática de meditação. Eu escrevo as palavras ou sentenças que podem ser conhecidas como algumas memórias, inventadas ou não. Sei que um dia  terá chumbo em minhas asas por ter lembranças que querem ser desmemoriadas. Sucumbir a suas obsessões seria até meio indecente, meio ridículo, aí vai que retorce, capricha no forte sotaque carioca e mostra uma coragem que nem sempre se sente, mas não haverá o que temer.

Na empreitada de então, foram ouvidos oito dos nove integrantes que não conheciam bem a área, tudo é forma, aparência, ilusão e perspectiva. Depois de troca de acusações eles entram para o quarto. E o quarto entrará pra história.

Sim, ultrapassaram alguns limites. De tal fruição nada se sabe.

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Helena Almeida

 

 

 

Voltou para casa sozinha

Poderiam deixar você nua em pêlo no meio da rua que não iria adiantar. A revolução de enterrar ou incinerar experiências, principalmente as não completas, permanecerá flutuando na íntima e desenvolvida vida. Pelos risos afora, com uma frequência bastante assídua, a flutuação seria o antídoto necessário para que ninguém estacionasse tanto em seus hábitos e costumes quanto ela. E que de um moralista discreto se transforme numa alma boa. O controle que se impõe ao treinar a aterrissagem trata-se precisamente de uma mente focada, calma. Ela faz tudo de si pra si e, escondida na sua não tão frágil sensatez, a pretensa liberdade aviva com um sistema mais afinado. A realidade e suas tragédias podem ter escapado às suas tentativas de controle e manejo exigindo um movimento brusco para manter o olhar altivo, ainda que se curve em demasia na presença de lembranças já anêmicas. 

Deu uma volta nos calcanhares e seguiu.

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Vivian Maier

 

Azeitonas e besouros

Gostaria de ser coesa, calma e frívola. Nunca esqueço daquele vapor prolongado e suave dos meus 14 anos. Sonhava adeuses e sombras, dragões e gigantes. Cá estamos nós, nesse lugar, largamos as tralhas, as bolsas e as pedras. Nus a olhar grãos. Quando a comunicação deixa de existir, e as pedras fazem parte do alfabetário, o mar engole o sol e nem a lua traz a palavra novamente. Duvidam, não acreditam, retrucam. Aí eles querem explicações mais pro grotesco que pro alívio. ‘Até quando vais guardar o segredinho?’ Perguntam. Numa ilusão obstinada e persistente tentam dar algo de si mesmos, tentam; devem gostar de azeitonas e besouros. Saem dali, se separam na esquina, leve aceno, sorriso amarelo cheio de lua, pé ante pé. Certezas do imaginário.

 

 

 

 

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Existir até na ausência da palavra

Acelerado o compasso da crise, a relação entre sem graça e sem sentido – sentimento generalizado no corpo e na pele, sufoca. Um paraíso de se viver e sabe que de nada adiantará muito pensar, pensar e pensar. Sentou-se na ponta do banco, de timidez, e se entrega ao pensamento sobre algumas questões sobre os dias. Documenta com sua Polaroid SX 70 o tempo para se divertir e tempo para a quietude. Em imagens ensolaradas com corpos que parecem não saber existir, mas carregados de sexo e às vezes amor. Às vezes carregados de um não-querer-ser-carne, às vezes uma presença natural. Mas este momento demanda maior reflexão acerca das pendências do seu próprio corpo. Aparar as arestas da carne, pele, arrepio. Respira profundamente até sentir as pontas das unhas, e mais um registro – acabam por se tornar uma aprendizagem. Imagem capturada.

É constantemente alimentada pela curiosidade, pelo que existe até na ausência da palavra. Pessoas que permanecem, que continuam, que andam, que roçam, que tem vontades. Sente um ressecamento nas lesões. São muito heterogêneas e podem não provocar, inicialmente, sensações dolorosas, ocasionando, dessa forma, um atraso da vontade de existir.

Enternece e lembra: tudo deve ser visto com seriedade.

 

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Busca do sublime

Se a vida acabasse em mel, perplexos seguiríamos em aparentemente normalidade – disse o brincalhão. E já em idade de se comunicar, o menino ainda não fala e por motivos pessoais os pais resolveram buscar em muitas e outras organizações religiosas a palavra perdida. O cosmos é íntimo numa forma como a alma se identifica com a vida. Mas uma coisa não poderá esperar: sobriedade, pois sua alma estará muito mais interessada em perder a cabeça do que em mantê-la no devido lugar. A mudez do menino atordoa quem não compreende e em meio a exames, bençãos, rezas, súplicas, ele simples está. Busca o sublime (não conforma com a banalização)aquela aventura que te tire dessa existência ordinária com a qual já discorda visceralmente. Não, não teria idade para isso ainda…  para pensar sobre os ordinários dessa vida. Mas de alguma forma reage a elas com mudez.

O sublime está longe, mas está perto também, está no viés dolorido do entardecer de outono.

O sublime pode ser encontrado em alguns pensamentos e que ao observá-los fica surpreso na qualidade e profundidade desses. Imaginava incapaz de produzir poesia, mas eis que se pega em pensamento descrevendo poeticamente os acontecimentos. Encontra o sublime  nos comentários surrealistas, nas ladainhas, nas luzes na sua garganta, medidores, instrumentos cirúrgicos (que te sequestram da existência almejada e te devolvem ao lugar onde está).

Um dia irá gritar aos quatro ventos: a Vida é sempre surpreendente. Por enquanto, boca miúda. Vosso pai evém chegando.

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Onde haveria um lugar assim?

As mesas são cobertas de objetos azuis vindos de várias partes do mundo. Um clarim começou a tocar e o mundo se dividiu entre almas atormentadas e almas atormentadoras. Rapidamente se tornou uma defensora das teclas sensíveis para um melhor controle dinâmico, e isso é o que sustenta a prática até hoje. Mil anos luz naquela esfera a fez  aprender e a desenvolver sozinha métodos sonoros, plásticos e também com letras. Como uma criança fazendo sua versão gráfica do groove. A princípio em sua forma original, depois rapidamente passando de um híbrido a uma ferramenta maravilhosa e assim, com ela poder usar para compor imagens. Automatizar alguns processos (tempo, vibrato) foi tão eficaz  que em seguida teve o desembarque do navio no infinito se tornando assim uma especialista em sons espaciais. Seu interesse por sistemas (já fizemos uma vez um rádio de cristal), a diferenciava e a colocava num outro patamar liquefeito. Logo foi  reconhecido e percebido como algo interplanetário numa parte de aprendizado e percussão (a pontuação era minimalista, sem prejuízo para regularizar as ideias).

Maravilhe-se. Homens de sensibilidade profunda já não necessitavam tocar os pés no chão para se locomover, deslizavam numa camada sonora invisível e muito próxima do silêncio. Resultado do delírio de que vivemos na forma sólida e leal. Acumular dados ali onde exista uma certa simplicidade cirúrgica dos diálogos e das pequenas notas do cotidiano. A fauna e a flora transbordaram os limites, saindo pelas janelas e buracos carcomidos da nave.  O único elemento de decoração era uma lâmpada feita por Giacometti onde estavam também milhões de livros. Desinteressastes na sua maioria. A cinco minutos da colisão, seus olhos ficaram azuis, e seu corpo foi percorrido por tremores. Foi onde aconteceu o céu de maio mais lindo que já se viu.

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Mãos inertes

Chega cansada do trânsito, da falta de educação, da falta de um mísero silêncio naquele ligeiramente entediante bairro, da falta de. A falta de. O ônibus daquele horário era insuportável, a noite semifria, o sacolejo. Corre para o banho, tamanha é sua demonstração de rigor e de compreensão com seu próprio corpo. Havia alguns mortos era certo, o que era um alívio. Aqueles dos quais sua alma foge, dos não afagos. Volta para casa sem ter conseguido nada. Enquanto o corte no seio esquerdo foi sendo curado, outro quase igual aparecia na parte interna da coxa direita. Uma migração contínua da ferida pelo corpo era dolorosa e não se descobria a causa. Um mal ia fechando e outro logo se precipitava a se abrir. Sangrava e marcava, seu corpo já estava com sete cicatrizes (costas, mão, seio, barriga, joelho, planta do pé e agora coxa). Sofria com as lembranças que as marcas não deixavam esquecer. Absorvia grandes porções de ar para evitar o sufocamento da taquicardia que a não-calma trazia. O sistema nervoso tinha seus jeitos, artimanhas. Por trás dos suspiros queixosos e lamentos mudos havia o egoísmo. Auto circunscrita dentro das certezas, dos conceitos, pontos de vista que se veste deles com tamanha tenacidade que o limite está se tornando ensurdecedor.

Não há ajuda possível já que se recusa a sair e aliviar o peso de forma elegante. Cicatrizes eventuais ainda sem causa, além das próprias certezas. Há cura – dizem. Expurgando. Mas não se atreve a sair de si.

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Por uma vida encarnada

Chega de ilusões, ainda que uma parte sua evite a todo custo perdê-las. Sem querer e sem buscar, de repente se depara com tua própria alma e não sabe o que fazer, pois o momento evoca aquela circunstância de encontrar – que nada mais é do que uma interpretação espiritualóide para um fenômeno bastante natural do próprio corpo: sonhar acordado. O dia estava nublado, cinza escuro, ventava forte e nas mãos trazia pedrinhas. Não via ali nada que pudesse ajudar a atravessar aquela fronteira. Fora covarde. E a chave não está ali.

Alguém que supostamente deveria saber o nome daquilo, mas que não conseguia, nem se importava, recordá-lo. Mesmo passando pelo constrangimento de ter de conversar com essa pessoa, espreitando pelo momento ideal em que ela teria de refrescar a memória. Tamanha displicência com a necessidade de fazê-lo (por puro medo de sofrer) a jogava naquele limbo desmemoriado. Auto-imposta, a força da memória é dolorosa (melhor não lembrar, não falar, não tocar, não ver, não nada.)  É um modo de querer que tudo o que não nos bastamos sejam do tamanho do fato que teimamos em viver com o tudo (pouco) que somos. Cobiça de ser o que imaginamos. Um assunto, porém, ela prefere evitar: o improvável do invisível que nos levariam a uma outra humanidade. Hoje seu sonho fora sobre o toque, a carne macia da mão. Mira, antes de tudo, o passado.

Uma sobrevida.

 

 

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Quais são as palavras que você ainda não tem?

O único voto ainda desconhecido era o seu. Estavam fazendo de tudo com menos tempo. Se houvesse o mínimo de cuidado com os detalhes, não saberia que estava prestes a ser esquecida. Uma linguagem cujos códigos já estão definidos, não tendo tido ali nenhum papel significativo em sua construção. Era uma linguagem já estabelecida e que não poderia ser quebrada ou questionada, principalmente por quem. Uma postura cada vez mais ativa e irredutível frente a qualquer desafio e sentirá força para alcançá-la (a ação) pelas palavras. Interrompida a visibilidade sem a qual não poderíamos viver verdadeiramente,  cada um de nós desenha o rosto de seu próprio medo, essencialmente cientes de que não deveriam acreditar tão facilmente no que era dito.  A promessa de imortalidade, em um sentido, é favorável a toda e qualquer forma para compartilhar e espalhar tão bela empreitada. Porque você abraçou, confortou e disse como era e que iria tentar triturar seus ossos até virar poeira?  O procedimento que aparentava ter era simples, direto e claro por conta de suas reais e naturais necessidades.  Beleza efêmera! Toda vez que olha, chama, pensa… missão pessoal também. Soltar a voz  tem riscos: vai mudar ou acabar com algo. Silêncios não lhe protegeram. A seu favor e a seu lado calados, como garrafas, transformando silêncios em linguagens, viajavam. Só pra provocar aprendemos a trabalhar e falar. E quando estamos cansados ficamos estritamente condenados à mudez, e até mesmo à desaparição. De outra pessoa esperamos mudanças. 

Até o fechamento desta matéria o caso não havia sido resolvido e a acusada continuava algemada a uma cadeira.

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